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Você sabe o que ocorreu
com /t/ na passagem do latim para o português? Depende
da posição que esse fonema ocupava no vocábulo.
Assim, temos:
• Em posição inicial – Geralmente,
manteve-se: tale > tal,
tauru > touro, tegula
> telha, tenere >
ter, turre > torre.
• Em posição medial
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Intervocálica –
Normalmente, sonorizou-se:
acetu > azedo, amata
> amada, lutu > lodo,
mutu > mudo, rota
> roda. Isso deve ter ocorrido no
século V e até princípios do VI. Nas
formas verbais da segunda pessoa do plural, o /d/ resultante
da sonorização caiu em todos os tempos em que
permaneceu intervocálico: amatis
> amadis > amais. Entretanto,
a passagem /t/ > /d/ nem sempre aconteceu: em cautu
> couto, /w/, por seu caráter
algo consonantal, foi responsável pela preservação
de /t/. Quando este era seguido por ditongo
crescente, resultou em /z/ ou /s/: ratione
> razão, pretiare
> prezar, tristitia >
tristeza, gratia > graça,
militia > milícia,
statione > estação.
No século III, como afirma Papírio, na combinação
ti + vogal, a sonoridade de “ti” era /tsi/ e as
palavras eram pronunciadas como se em vez de /t/ houvesse
/s/: *definiciones, *terminaciones. Se o
vocábulo era escrito com “t” dobrado, /t/
permaneceu: cattu > gato,
gutta > gota, matta
> mata, mittit > mete,
sagittam > seta.
Podemos estranhar por que em várias palavras portuguesas
em que /t/ está em posição intervocálica
não houve a sonorização desse fonema,
como cutucão e pata. Nestes exemplos,
tais vocábulos surgiram já em plena vigência
do português. Em outros casos, trata-se de empréstimos,
como rota (caminho, direção), do antigo
francês rote. Outras ainda são palavras
de formação erudita, ou seja, apesar de haverem
passado por transformações fonéticas
pela ação popular, tiveram a forma original
latina restaurada pelos sábios durante o renascimento
português (séc. XVI), a qual assim convive com
a evoluída, com algumas adaptações gráficas.
Exemplo é cathedra, que evoluiu
para cadeira e depois foi reintroduzida
no léxico da língua como cátedra.
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Não-intervocálica –
Precedido de consoante, /t/ geralmente se manteve: arte
> arte, astru > astro,
bestia > besta, dictu
> dito, multu > muito,
sanctu > santo.
Quando t + i foi antecedido por consoante, tornou-se /s/:
fortiam > força,
silentium > seenço
(arcaico), tertiarium > terceiro.
O grupo latino ct + y tornou-se /is/: destructione
> destruição, electione
> eleição. Seguido
de consoante – geralmente /r/, com que formava grupo
consonantal –, /t/ permaneceu: atriu
> átrio, mitra
> mitra, patrociniu >
patrocínio, patronu
> patrão, retractione
> retração. Às
vezes, no entanto, os falantes sentiram o grupo todo como
intervocálico e assim /t/ passou a /d/: latrone
> ladrão, matrastra
> madrasta, petra >
pedra, putre > podre,
**vitriu > vidro. Há
ainda outros fenômenos que se referem ao grupo /tr/,
descritos na bibliografia indicada, para a qual remetemos
o leitor.
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• Em posição
final – Sofreu apócope
ainda no latim vulgar: amat > ama,
bibit > bebe, cantant
> cantam, legit > lê, post
> pois.
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* Apenas para demonstrar a pronúncia.
** Forma não-documentada.
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