Dica n.º 19 - Sexta, 01.12.2000
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Infinitivo flexionado

Este tema não é dos mais simples entre os fatos gramaticais da língua portuguesa. O infinitivo é forma nominal do verbo e pode apresentar-se nas modalidades flexionada e não-flexionada. (Veja o verbete "Infinitivo" no Glossário Gramatical.) Alguns autores adotam, para essas formas, a nomenclatura de infinitivo pessoal e impessoal. O prof. Hermínio de Campos Mello contesta esse uso alegando que tanto o infinitivo flexionado como o não-flexionado são pessoais, ou seja, referem-se a alguma pessoa gramatical. O mestre parece ter razão quando se empregam flexões como "Vou caminhar amanhã", "Ela vai caminhar amanhã" ou "Todos vão caminhar amanhã". Nestes exemplos, embora em sua forma não-flexionada, ou seja, "impessoal", o infinitivo relaciona-se sempre a uma das pessoas gramaticais.

O infinitivo flexionado é idiomatismo da língua portuguesa, ou seja, é fenômeno característico, típico de nossa língua, embora não seja exclusivo dela. Tudo indica que se originou do imperfeito do subjuntivo latino (hipótese de José Maria Rodrigues) e já aparece no primeiro documento conhecido escrito em língua portuguesa, a "Cantiga da Ribeirinha" (veja a pág. Você sabia? n.º 13), como se pode ver abaixo:

 
"e vos, filha de don Paay
Moniz, e ben vus semelha
d'aver eu por vos guarvaya".

O infinitivo pode, pois, flexionar-se em todas as pessoas gramaticais: amar (eu), amares (tu), amar (ele), amarmos (nós), amardes (vós), amarem (eles). Morficamente, o infinitivo flexionado é idêntico ao futuro simples do subjuntivo nas conjugações verbais regulares. Distingue-se deste por encerrar significado declarativo (afirmativo ou negativo: "Quero que os alunos tenham mais aulas de Português para entenderem o infinitivo flexionado"), ao passo que o futuro do subjuntivo expressa hipótese condicional (se eles entenderem) ou temporal (quando eles entenderem). Outros exemplos de orações com o infinitivo flexionado: "Ao se aproximarem os professores, os alunos levantaram-se", "As andorinhas vinham chegando em revoada até pousarem todas sobre a figueira" e "Lembrou existirem emendas na ata da assembléia anterior".
Dois autores estabeleceram regras para o infinitivo flexionado: Jerônimo Soares Barbosa e Frederico Diez (pronuncie Dits). Vejamos o que consta de cada uma:
· Regra de Soares Barbosa - Em um período composto, se o sujeito do verbo no infinitivo for diferente do sujeito do verbo da outra oração, o infinitivo será flexionado. Ex.: "(Eu) Creio (nós) termos sido enganados". Por outro lado, se os sujeitos do verbo no infinitivo e do verbo da outra oração forem os mesmos, o infinitivo não se flexionará. Ex.: "(Nós) Viajamos juntos para (nós) discutir o assunto em profundidade". O autor lusitano apresenta ainda outros casos de flexão do infinitivo.
· Regra de Frederico Diez - Somente se usa o infinitivo flexionado quando ele pode ser substituído por uma forma modal. Neste caso, é indiferente se ele tem ou não seu próprio sujeito. Ex.: "(Eu) Peço-lhes não recomeçarem (vocês) a discussão" ® sujeitos diferentes. Essa oração equivale a outra em que os dois verbos estão na forma modal: "(Eu) Peço-lhes que (vocês) não recomecem a discussão". Exemplo em que os sujeitos são os mesmos: "(Eles) Estão comemorando por (eles) terem passado no vestibular", que equivale a "(Eles) Estão comemorando porque (eles) passaram no vestibular". Esta regra de Diez é ótimo guia para se apurar o estilo e evitar-se "que e porque" na medida do possível. Quando cabível, suprimam-se esses elementos de ligação e converta-se o verbo da forma modal na forma infinitiva. Dessa maneira, em vez de "Ele disse que é possível que entremos", use "Ele disse ser possível entrarmos". (Veja também a Dica n.º 1, Estilística.)

Leia agora algumas observações sobre o infinitivo baseadas em escritos do prof. Campos Mello (CURSO, s. d.).

1. O infinitivo será ou não flexionado quando a clareza assim o exigir. Ex.: "Infanta, no exílio amargo, só o existirdes me consola" (Tasso da Silveira). "D. Amélia sofria com aquela animosidade dentro de casa. Uma vez falou com o marido para sair, para procurar um lugar para morarem em casa que fosse deles" (José Lins do Rego). Se o infinitivo não se flexionasse, os sujeitos dos verbos assinalados seriam diferentes dos expressos nesses exemplos.
2. Certa ênfase de estilo pode justificar o emprego do infinitivo flexionado, como no exemplo: "As mulheres cochilando nos quartos, os homens a caçoar e a rir na sonolência, a se espreguiçarem do bom almoço pelas redes e cadeiras" (Dinah Silveira de Queiroz).
3. Cumpre não confundir o infinitivo flexionado com o futuro do subjuntivo. Assim, em "Se algum dia caírem estas linhas sob os olhos de alguém, rirão..." (Ciro dos Anjos), tem-se flexão do futuro do subjuntivo e não, do infinitivo.

A flexão do infinitivo, quando correta, propicia clareza, elegância e concisão à escrita. Para conhecimento mais amplo, consulte a bibliografia recomendada.

Leia mais em:
Curso de revisão criativa, estudo n.º 15. Infinitivo flexionado e não-flexionado, de Hermínio de Campos Mello.
Gramática metódica da língua portuguesa, de Napoleão Mendes de Almeida.

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