Ter que ou
ter de?
Os gramáticos tradicionais resistem, com base na função
sintática dos termos da oração, a aceitar
as duas construções como equivalentes, ainda
que esse uso seja mais do que generalizado, pelo menos no
Brasil. Vejamos o que diz a Gramática tradicional:
Ter que – O verbo ter pode integrar
a locução
verbal ter (flexionado ou não)
que + infinitivo
quando, além da idéia de obrigatoriedade que
o conjunto encerra, o que assume a função
de pronome
relativo. Neste caso, há a óbvia
necessidade da existência de antecedente do tal pronome.
Assim, temos: “Meu advogado tem caso
importante que estudar”, “Tenho
muito que fazer no sábado” e
“Amanhã, Joana vai ter coisa
mais urgente que tratar”. Nas três
orações, que é pronome relativo
e seus antecedentes são “caso importante”.
“muito” e “coisa mais urgente”, respectivamente.
Repare que ele é objeto direto de “estudar”,
“fazer” e “tratar”.
Ter de – A construção ter
(flexionado ou não) de + infinitivo
também passa a idéia de obrigatoriedade e a
preposição rege a forma nominal
que a segue. Portanto, de nada tem a ver com antecedentes.
Por isso, se o que não tem antecedente com
o qual se relacionar, é indevido e deve ser substituído
pela preposição de. Dessa forma, temos:
“Os funcionários tiveram de
sair mais cedo”, “Tenho de
efetuar vários pagamentos hoje” e “Meu
pai vai ter de estar em
Marília no dia 30”.
Na maior parte das construções em que aparece
a dupla ter + infinitivo, cabe, segundo
os gramáticos, a preposição de
em vez de que. Este, como vimos, só deve ser
empregado se se referir a algum antecedente. A relutância
dos especialistas deve-se à dificuldade de atribuir
função sintática ao que
sem antecedente em contextos daquele tipo. Então,
a opinião dominante entre eles é a de condenar
o uso, mesmo que amplamente disseminado, por impossibilidade
meramente taxionômica, ou seja, de classificação.
Não vemos problema em aceitar tal uso, pois a própria
Gramática admite a existência de palavras “inclassificáveis”,
chamadas então de palavras “que denotam algo”,
como, por exemplo, somente, em “Somente
João poderia ter feito isso” (denotação
de exclusão), e aliás, em “Não
escrevi nada, aliás, só uma
página” (denotação de retificação).
É verdade que estamos falando de coisas diferentes:
sintaxe, no assunto desta página, e morfologia, nestes
últimos casos apresentados. Entretanto, se em um tópico
admitimos haver formas que não se enquadram em nenhuma
categoria, por que não admitir também o emprego
do que sem função definida?
De qualquer modo, recomendamos – especialmente em provas
escolares, vestibulares e concursos – o seguimento da
prescrição tradicional. Agindo assim, o aluno
ou candidato não terá problemas com quem estiver
corrigindo sua prova, notadamente se este seguir fielmente
as determinações tradicionais.
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