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Sistema,
norma e
fala
Esses termos da Lingüística
representam realidades distintas, mas interdependentes. Vejamos:
- Sistema – Conjunto formado pelas unidades da língua
– em uso e ainda possíveis de serem usadas –, que se relacionam
segundo regras determinadas. Essas regras são estabelecidas
tacitamente pelos próprios usuários e não, pelos gramáticos,
que simplesmente as descrevem. Só se verificam alterações
no sistema quando há adesão coletiva. É por isso que algumas
inovações ficam restritas a um único falante, como o vocábulo
“ceguez”, da obra de Guimarães Rosa.
O sistema corresponde à língua ou código
lingüístico e consiste no conjunto de possibilidades
verbais, muitas das quais (ainda) inexploradas pelos falantes.
Assim, em português, enquanto há inúmeras unidades lexicais,
como “casa”, “um”, “pertinente” e “profligar”
(todas com seus vários significados), há muitas seqüências
de fonemas
ainda não utilizadas, à espera de os falantes associarem
a elas algum significado, como “*brina”, “*lagipa” e “*torrigo”. (Os asteriscos indicam formas
hipotéticas.) A língua é entidade social, comum aos usuários
de todo um grupo falante. Para poder se comunicar com usuário
de outro sistema, o locutor (emissor) precisa utilizar código
lingüístico de conhecimento pelo menos parcial do seu interlocutor
(receptor). Em lugar dos termos “sistema”, “língua” ou “código
lingüístico” alguns autores preferem esquema.
- Norma – Conceito introduzido pelo lingüista romeno
E. Coseriu, que consiste nos padrões de uso, na maneira
como os usuários utilizam o sistema ou código lingüístico.
Assim, em razão da norma, os falantes valem-se de algumas
possibilidades e descartam ou ainda não utilizam outras.
É também em função da norma que existem lacunas na língua.
Por exemplo, em português, não há nomes coletivos específicos
para designar reunião de baleias ou de ostras. É também
devido à norma que diferentes regiões de um território utilizam
diferentes formas lingüísticas. Assim, os falantes nordestinos
designam determinada raiz comestível por “macaxeira”, enquanto
os do Centro-Sul a chamam de “mandioca” e “aipim”. (Veja
também a pág. Você
sabia? n.º 25.)
As crianças muito pequenas e outras pessoas com pouca
ou nenhuma escolaridade costumam brindar-nos com “pérolas”
que achamos engraçadas e revelam como a norma determina
quais formas o grupo deve usar. Por exemplo, assim como
diz “corri” e “comi”, a criança acaba dizendo “fazi”. Nada
impediria que fosse assim, mas a norma aceita pelo grupo
prescreve “fiz”. Há também
frases atribuídas a famosos jogadores de futebol,
como esta: “Eu desconcordo com o que você disse”.
Sintaticamente, a frase é gramatical e o vocábulo “desconcordo”
está construído conforme as regras portuguesas. Entretanto,
os falantes sempre preferiram discordo em seu lugar.
Coisas da norma.
- Fala – É a concretização – tecnicamente, realização
– do sistema. É o uso individual da língua por parte dos
falantes e é pela fala que ela exerce seu papel de código,
de instrumento de comunicação. Assim, quando você emite
a seqüência /’agwa/, que se associa ao significado H2O
para constituir o lexema ou palavra água, está produzindo
fala. Esta se compõe de infinitos atos comunicativos praticados
pelos usuários para poderem transmitir pensamentos, sentimentos
e exteriorizar seus desejos e necessidades.
Em resumo, a língua ou sistema é entidade abstrata, coletiva
e geral, memorizada na mente de todos os falantes de um grupo
lingüístico; a norma é padrão grupal de uso,
é o modo como os usuários se valem da língua preferindo
certas formas e preterindo outras; fala é a concretização individual
do código lingüístico pelos participantes de um ato comunicativo.
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