Dica n.º 49 - Sexta, 29.06.2001
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Flexão gradual de substantivos "não-contáveis" ou "contínuos".

Comentaremos agora aspecto particular da flexão de grau de certa classe de substantivos, os "não-contáveis" ou "contínuos", sobre o qual se omitem as mais conhecidas gramáticas disponíveis no Brasil. Segundo essas obras, o grau aumentativo e o diminutivo expressam tamanho - grande (chinelão, orelhona) e pequeno (chinelinho, orelhinha) em relação à forma normal: chinelo e orelha - ou então certa intenção pejorativa (bocarra, cabeçorra/jornaleco, velhote) ou valorativa/afetiva (carrão, mãezona/filhinho, vovozinho). Esses substantivos, porém, enquadram-se na categoria dos "contáveis" ou "descontínuos", isto é, expressam unidades que podem ser contadas. Dessa forma, podemos facilmente contar um chinelo, dois chinelos; uma orelha, duas orelhas; um velho, dois velhos; uma mãe, duas mães; etc. O caso muda de figura quando se trata de substantivos não-contáveis, como água, ar, fogo, terra, cachaça, chope, frio, calor e assim por diante. Admitiriam eles flexão de grau, já que não lhes podemos avaliar o tamanho? Como saber se o ar, o fogo, a terra, a cachaça, o chope, o frio e o calor são grandes ou pequenos? Isto porque - com relação à cachaça ou ao chope, por exemplo - uma coisa é o líquido e outra é o copo que o contém; este, sim, pode ser grande ou pequeno. Mesmo assim, por metonímia, formas como cafezinho são explicáveis, já que a bebida "café" é servida em pequenas xícaras. Mas o que dizer de agüinha e chopinho? Entretanto, vemos em nosso linguajar corriqueiro expressões como "Vou tomar uma agüinha", "Está bom o arzinho lá fora", "O Chico também é da terrinha", "Quero experimentar aquela sua cachacinha", "Vamos tomar um chopinho?", "Aqui está um friozinho gostoso". Observamos, pois, que o diminutivo de nomes contínuos, no geral, não expressa tamanho, mas desejo de exprimir intenção afetiva, carinhosa ou amistosa. Já o aumentativo parece ora exprimir afetividade (verdão e azulão, referindo-nos a times de futebol, e Castelão, Bezerrão, nomes de estádios) ora revelar grande quantidade mesmo, mas com auxílio da metonímia, como em: "Que calorão, hem?" e "Deparei com fogaréu assustador". Repare que o calor não pode ser grande, pois é sensação ou qualidade de quente. O que é grande, ou melhor, elevada é a temperatura, medida em graus. Não obstante, no lugar de temperatura elevada, dizemos calor grande ou calorão. Em outras palavras, por metonímia, em vez do fenômeno físico, mensurável (temperatura), referimo-nos a seu efeito (a sensação: calor). Da mesma forma, recorremos a outra figura de linguagem para dizer fogaréu, aumentativo de fogo. Este não pode ser grande ou pequeno, mas sim, sua fonte. Assim, o fogo é parte da fogueira (monte de lenha em chamas), a qual pode, sim, ser grande ou pequena: fogueirona ou fogueirinha. Como utilizamos parte da fogueira (o fogo) no aumentativo - fogaréu -, valemo-nos agora da sinédoque para produzir flexão de grau em algo que não pode ter o tamanho medido. Neste caso, tomamos a parte (fogo) no lugar do todo (fogueira). Podemos ainda considerar grandes ou pequenas as chamas, mas não o fogo em si, o fenômeno da combustão. Agora, recorremos novamente à metonímia, pois tomamos o abstrato (fogo) no lugar do concreto (chama). Em resumo: podemos flexionar, quanto ao grau, substantivos não-contáveis ou contínuos para exprimir afetividade, pejoratividade ou para expressar tamanho grande mesmo. Neste caso, valemo-nos de figuras de linguagem como a metonímia e a sinédoque.

Leia mais em:
Gramática metódica da língua portuguesa, de Napoleão Mendes de Almeida, §§ 235 a 240.
Novíssima gramática da língua portuguesa, de Domingos Paschoal Cegalla (edição de 2000), pp. 148-151, especialmente as "Observações" da pág. 150.

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